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PorFabiana Ferrão

Franqueado e os cuidados com as cláusulas de não concorrência

Um contrato de franquia, em sua essência, é um contrato de cooperação entre empresas independentes que, nos termos da Lei 13.966/2019, permite a utilização, pela franqueada, da marca e de outros objetos de propriedade intelectual sempre associados ao direito de produção ou distribuição, exclusiva ou não, de produtos ou serviços, bem como ao direito de uso de métodos e sistemas de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido pelo franqueador.

Nesse sentido, as cláusulas de não concorrência ou non compete estabelecidas nesse tipo de contrato têm por objetivo resguardar o know-how, ou seja, os conhecimentos e técnicas específicas empregados no negócio empresarial, de maneira a manter o sigilo comercial ou industrial.

Ocorre que, não raras vezes, inexiste a transferência de know-how entre as partes e, para além disso, tais cláusulas impõem ao franqueado uma limitação ampla e irrestrita, com proibição do exercício das atividades empresariais de forma genérica, sem definição dos limites específicos nos aspectos materiais (o que efetivamente se proíbe na concorrência), espaciais (o alcance territorial) e temporais (por quanto tempo).

Não por outra razão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se posicionou a respeito, tornando pacífico o entendimento de que são válidas as cláusulas contratuais de não-concorrência, desde que limitadas espacial e temporalmente, porquanto adequadas à proteção da concorrência e dos efeitos danosos decorrentes de potencial desvio de clientela, valores jurídicos reconhecidos constitucionalmente (REsp 1.203.109, MARCO AURÉLIO BELLIZZE).

Certamente, o critério mais relevante a ser adotado na análise da validade da cláusula de non compete é a preservação do livre mercado, ou seja, as partes podem disciplinar o exercício da concorrência, desde que não a eliminem por completo.

Assim, para que essa cláusula não seja considerada abusiva, a ponto de ser declarada nula pelo Judiciário, é de suma importância que a franqueadora atente para a limitação nos aspectos material, espacial e temporal, evitando o estabelecimento de controvérsias e questionamentos futuros pela franqueada, e com isso, eliminando despesas com possíveis ações judiciais.

Pelo lado da franqueada, deve-se atentar, igualmente, para a redação da referida cláusula no contrato e reivindicar antecipadamente a revisão da mesma, caso não atenda aos requisitos de validade acima, a fim de preservar a livre concorrência que deve nortear a relação interempresarial, sem descumprir os termos do contrato.

PorFabiana Ferrão

Efeitos da perda da eficácia da MP 927 nos contratos de trabalho em vigor

No último dia 19/07/2020 findou o prazo de validade da MP 927, a primeira medida provisória que tratou das alternativas que poderiam ser adotadas pelas empresas, em matéria trabalhista, no período de pandemia. Era ela que tratava do teletrabalho, antecipação e fracionamento de férias, banco de horas e outras medidas. Com a perda da validade sem que tenha sido convertida em lei, como fica o já pactuado com os empregados?

Conforme já mencionado em textos publicados anteriormente, embora a publicação da MP 927 tenha ocorrido em 22/03/2020, foram consideradas válidas as medidas adotadas por empregadores, tomadas de acordo com a MP, no período de 30 dias antes da entrada em vigor da mesma, ou seja, o período de vigência desta norma foi, portanto, de 21/02/2020 a 19/07/2020.

De acordo com a nossa Constituição Federal, após a perda da eficácia de uma MP, deve ser editado um decreto legislativo, no prazo de 60 dias, a fim de tratar dos efeitos da MP em relação aos atos praticados na vigência da mesma e aos que continuam sob efeito das disposições nela previstas, ou seja, a validade dos atos praticados de um modo geral.

Na maioria das vezes esse decreto não é editado e os atos praticados são convalidados. Ainda assim, a expectativa é de que o Congresso o faça nos próximos dias. Contudo, aguardaremos e certamente, havendo novidades, sinalizaremos para todos.

De qualquer forma, o que foi celebrado durante a vigência da MP, é válido, de maneira que as medidas já adotadas durante a vigência da mesma devem ser mantidas até o término do prazo fixado no respectivo termo aditivo do contrato de trabalho, firmado no período de vigência da MP, ou seja, qualquer ato praticado enquanto esta se encontrava em vigor, continua vigente até o término do prazo previsto na medida adotada, inclusive teletrabalho, antecipação de férias coletivas ou individuais, banco de horas etc

Enfim, o que muda com a perda de eficácia da MP 927, a partir do dia 20/07/2020?
1 – Não será mais permitida a alteração do regime de trabalho de presencial para teletrabalho sem a concordância do empregado, devendo ser observado o que dispõe a CLT;
2 – Mesmo que estejam de acordo, aprendizes e estagiários não poderão mais trabalhar em regime de teletrabalho;
3 – A comunicação de férias volta a obedecer o disposto na CLT (comunicação com 30 dias de antecedência, tempo mínimo de 10 dias, pagamento com 2 dias de antecedência do gozo das férias);
4 – A comunicação das férias coletivas, da mesma forma, deve obedecer as normas da CLT, com antecedência de 15 dias, período mínimo de 10 dias e obrigação de comunicar sindicato e Ministério da Economia;
6 – Eventual acordo de banco de horas não mais poderá prever compensação em 18 meses, voltando ao prazo anterior (6 meses, por acordo individual);
7 – Volta a ser obrigatória a realização de exames periódicos médicos ocupacionais.

PorFabiana Ferrão

Redução da jornada e suspensão do contrato de trabalho. Agora é lei!

No último dia 06 de julho, foi publicada a lei 14.020/2020, derivada da conversão da Medida Provisória 936, que trata da possibilidade de suspensão do contrato de trabalho e redução da jornada, durante a pandemia, comentada em diversas oportunidades em nosso site e em lives realizadas nos últimos meses.

Alertamos, porém, que, ao contrário do veiculado nos meios de comunicação, essa lei não permitiu a imediata prorrogação dos acordos feitos até então e transferiu essa competência ao Poder Executivo, que no último dia 13/07/2020 finalmente editou o tão esperado Decreto, de nº 10.422/2020, regulamentando a prorrogação dos prazos.

No referido Decreto permitiu-se a extensão dos prazos previstos na MP 936, de maneira que não seja ultrapassado o prazo de 120 dias no total. Assim, à suspensão temporária do contrato de trabalho foi acrescido o prazo de 60 dias (antes do decreto somente as empresas somente poderiam suspender por 60 dias) e à redução proporcional de jornada e de salário foi acrescido o prazo de 30 dias (antes do decreto o prazo máximo era de 90 dias).

Os períodos de suspensão do contrato e redução da jornada anteriores ao decreto serão computados para fins de contagem dos limites máximos resultantes do acréscimo de prazos acima citado e o somatório dos períodos (caso a empresa tenha utilizado ambas as medidas) também não poderá ultrapassar o prazo de 120 dias.

O decreto permite a suspensão do contrato de trabalho de forma fracionada, em períodos sucessivos ou intercalados, desde que iguais ou superiores a dez dias, observando-se o prazo máximo de 120 dias.

Quanto à lei 14.020/2020, diversas novidades foram trazidas, embora não comentadas com a mesma ênfase nos meios de comunicação, e que são extremamente relevantes, cabendo ressaltar que estas se aplicam somente aos acordos realizados a partir de 06/07/2020, à exceção da norma que trata da prevalência dos acordos coletivos e convenção coletiva sobre os acordos individuais, quando mais favoráveis ao empregado.

A primeira novidade que deve ser destacada é a criação de uma faixa salarial a ser observada pelas empresas que tenham auferido receita bruta superior a R$ 4.800.000,00, em 2019. Assim, para estas empresas, as medidas de redução de jornada de 50% e 70%, bem como suspensão do contrato de trabalho somente poderão ser implementadas, por acordo individual, para empregados que recebam até dois salários mínimos (R$ 2.090,00), mantendo-se a regra anterior para as demais empresas (limite de três salários mínimos – R$ 3.135,00).

A nova lei também admite a possibilidade de pactuação por acordo individual em qualquer hipótese, desde que a empresa complemente a redução, como uma forma de compensá-la, ou seja, desde que a redução não resulte na diminuição do valor total recebido mensalmente pelo empregado, incluídos neste valor o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, a ajuda compensatória mensal e, em caso de redução da jornada, o salário pago pelo empregador em razão das horas de trabalho.

No tocante à possibilidade de realização dos acordos individuais por meios eletrônicos eficazes, a lei trouxe previsão expressa neste sentido, o que não havia na MP 936.

Questão importante trazida com a lei foi a determinação de que prevalecerá o acordo coletivo ou convenção coletiva sobre o acordo individual, a partir da sua vigência e somente em relação às cláusulas que forem mais favoráveis ao empregado. Especificamente em relação a esta norma, a mesma se aplica inclusive aos acordos realizados anteriormente à lei. Assim, devem as empresas atentar para as normas coletivas que entraram em vigor no período do ajuste feito com o empregado.

Outra novidade é a obrigação de pagamento de ajuda compensatória ao aposentado que tiver o contrato suspenso ou a jornada reduzida, nos termos da lei. O valor da ajuda compensatória mensal deve ser, no mínimo, equivalente ao do benefício emergencial que o empregado receberia, inclusive para as empresas com receita bruta, em 2019, superior a R$ 4.800.000,00, que tiverem optado pela suspensão do contrato de trabalho, que deverão pagar, também, a ajuda compensatória de no mínimo 30% do salário do empregado.

Questão que gerou polêmica durante a vigência da MP 936 era em relação às gestantes. A lei põe fim à discussão, estabelecendo que o valor do salário-maternidade não será prejudicado pela redução ou suspensão, caso estas ocorram no período de gozo de tal benefício, ou seja, será interrompida a aplicação das medidas por ocasião do parto ou da apresentação de atestado médico afastando a empregada, a partir de 28 dias antes do parto e deverá ser pago o salário-maternidade integral.

Ainda em relação à gestante, estabelece a lei a soma das garantias de emprego por ocasião da gestação e por força da suspensão do contrato ou redução de jornada. Assim, o início do prazo dessa garantia somente se dará após o término da garantia de emprego por força da gravidez, ou seja, as garantias não se sobrepõem mas sim se adicionam.

Quanto às pessoas com deficiência, a novidade é a impossibilidade de dispensa imotivada no período de pandemia, ou seja, trouxe uma estabilidade antes inexistente.

Por fim, a lei afasta a hipótese de fato do príncipe (artigo 486 da CLT) nos casos de paralisação ou suspensão das atividades empresariais determinadas por ato do Poder Público, para o enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da pandemia. Vale dizer, as empresas não poderão invocar em sua defesa que caberia ao Município, Estado ou União federal o pagamento da indenização devida ao empregado que teve o contrato de trabalho rescindido por ocasião dessa paralisação ou suspensão.

PorFabiana Ferrão

O vale-refeição e a suspensão do contrato de trabalho, a redução de jornada e o home office

A Medida Provisória 936 admitiu a redução de jornada e de salário, bem como a suspensão dos contratos de trabalho, desde que mantidos os benefícios concedidos aos funcionários, neste último caso. Desse modo, uma dúvida que tem acometido as empresas refere-se ao vale-refeição: considera-se benefício para essa finalidade? É preciso mantê-lo mesmo com o contrato suspenso, ou com jornada reduzida para 6 horas diárias ou menos?

Em regra, cancelar ou suspender benefícios, especialmente os concedidos por convenção coletiva, não é permitido por lei.

O vale transporte tem uma conotação própria, definida em lei e é concedido especificamente para cobrir as efetivas despesas do empregado com o deslocamento residência-trabalho-residência, de maneira que, inexistindo tal deslocamento, deve ser suspenso tal pagamento. 

Contudo, como fica o vale-refeição, considerando que ele, assim como o VT, está diretamente relacionado a (i) efetivo cumprimento das obrigações laborais (em caso de faltas justificadas, por exemplo, ele não é devido), e (ii) jornada de trabalho superior a 6 horas diárias?

Embora seja tudo muito novo, inusitado, sem precedentes e, portanto, sem a certeza quanto ao entendimento da Justiça do Trabalho neste aspecto, deve ser levado em consideração todo o estímulo dado à manutenção do emprego pelo Governo, com edição de normas efetivamente dedicadas também à manutenção da saúde financeira das empresas ou, ao menos, a redução dos impactos destas medidas de isolamento social nas empresas impedidas de funcionarem regularmente.

Considerando esse atual cenário, e o fato de que a MP 927 dispõe em seu artigo 2º que, durante o estado de calamidade pública, o empregador e o empregado poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, e que este prevalecerá sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição, pode ser adotado o entendimento de que, caso seja acordada com o empregado a supressão do vale refeição ou a substituição por outro benefício (cesta básica ou vale alimentação), este acordo será válido.

Ainda que a MP 936, ao permitir a suspensão do contrato de trabalho, disponha que o empregado fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador, não há uma previsão específica para o vale-refeição, que é concedido, tal como o vale-transporte, para cobrir despesas do empregado, todavia, com a refeição, como acima mencionado.

Da mesma forma que nas férias, no gozo de auxílio-doença ou em qualquer hipótese de suspensão do contrato de trabalho, é facultativo o fornecimento do vale-refeição, tal entendimento pode ser aplicado, minimamente, ao caso da suspensão prevista na MP 936.

Não nos parece razoável que, de um lado admita-se o não fornecimento do vale-refeição em caso de faltas justificadas ou férias, e de outro, se o exija em uma suspensão do contrato de trabalho. Em relação à redução de jornada, dá-se o mesmo: se o vale-refeição somente é obrigatório – segundo a imensa maioria das convenções coletivas – para jornadas em que haja a obrigatoriedade de intervalo para almoço (notadamente, aquelas superiores a 6 horas), não há sentido em exigi-lo nos casos em que a sua redução, de acordo com o admitido na MP 936, ficou em patamares menores do que esse.

Em relação ao teletrabalho (home office), a situação é similar. Ora, o vale-refeição justifica-se em razão de ter o empregado a necessidade de se alimentar na fora de casa quando em trabalho (por isso, vale-refeição, e não alimentação). Se a situação em que está inserido é diversa, não é razoável manter o mesmo benefício. 

Porém, essas são apenas algumas das linhas argumentativas. Em matérias apreciadas pela justiça do trabalho, considerando o posicionamento tradicional dos julgadores, sempre há o risco de adoção da interpretação mais favorável ao empregado, até mesmo quando ela desafia outros conceitos. 

Há ainda quem defenda, nesse tema, o entendimento de que seria uma alteração do contrato de trabalho prejudicial ao empregado (embora admitida pela MP), logo, o citado benefício deveria ser mantido. 

Especificamente quanto ao teletrabalho, há o entendimento de que, havendo a prestação do serviço, ainda que em casa, o empregado continua contribuindo para a produção da empresa e teria direito ao vale-refeição.

A situação é, naturalmente, nova e a jurisprudência ainda vai se acomodar quanto a tais temas.

Por não haver um consenso, o risco permanece e caberá à empresa a decisão quanto à supressão ou não. Caso opte pela supressão no período da alteração contratual, não se orienta a dispensa da formalização do acordo individual, a fim de que se possa utilizar a tese argumentativa aqui colocada.

Veja a matéria sobre a live realizada pela MSA Advogados em parceria com a Múltipla Consultoria sobre polêmicas da flexibilização da legislação trabalhista após as MPs.

PorFabiana Ferrão

Afinal, a MP 936 também abrange os contratos de trabalhos temporários?

No início da pandemia e do estado de calamidade pública decretado pelo Governo Federal, as empresas se mostravam receosas na adoção das medidas em relação aos contratos de trabalho em vigor, diante da ausência de um amparo legal. Contudo, após a edição das medidas provisórias que trataram sobre o tema, sobretudo a MP 936, o receio passou a ser a aplicação da norma a contratos de trabalhos específicos, dentre eles, o de trabalho temporário.

Embora a MP 927 (a primeira a tratar das alternativas para as empresas adotarem neste período de pandemia em relação aos contratos de trabalho, férias individuais e coletivas, teletrabalho etc.) traga em seu texto a previsão expressa sobre a aplicação da mesma aos trabalhadores temporários, o mesmo não ocorreu com a MP 936, que deixou essa brecha e vem trazendo muitas discussões.

Contudo, em tempos de guerra, não se mostra razoável criar obstáculos à aplicação de uma norma editada justamente para flexibilizar a legislação e aliviar as dificuldades enfrentadas por empresas e empregados. Logo, é indiscutível a possibilidade da suspensão do contrato de trabalho e da redução salarial nesses casos.

Ainda que o contrato de trabalho seja por prazo determinado e pareça incompatível a estabilidade exigida pela MP 936, a medida trará efetiva suspensão da prestação de serviços e da remuneração, logo, os dias da suspensão não serão contados para efeito de tempo de serviço e do prazo do contrato. Retornando o empregado às atividades, retornará a contagem do tempo restante.

Certamente, o cuidado maior se deve àqueles que estão em vias de findar o prazo do contrato e caberá às empresas que disponibilizam essa mão de obra adotarem a medida adequada a cada contrato de trabalho. Sendo assim, no que diz respeito à redução da jornada, o prazo desta redução deverá se ajustar ao prazo do contrato, levando-se em consideração a estabilidade exigida pela MP e, se for o caso, o mesmo deverá ser prorrogado para se adequar a esta exigência.

Quanto ao benefício emergencial previsto na MP 936, este não se confunde com o seguro desemprego e não pode ser negado, enquanto não editada outra norma que exclua os trabalhadores temporários o que, até então, não ocorreu.

Já as empresas tomadoras do serviço prestado por estes trabalhadores, caberá apenas a análise do contrato com a prestadora dos serviços. Caso as atividades sejam suspensas por completo, o melhor a se fazer é um aditamento ao contrato, prevendo a suspensão dos seus efeitos pelo mesmo prazo. Caso sejam apenas reduzidas as atividades, o aditamento deverá prever tal redução, pois afetará substancialmente o valor do contrato e, assim, ambas as partes serão resguardadas.